Na intenção de ajudar com uma palavra amiga, muitas pessoas fazem comentários ou perguntas que deixam a tentante e/ou o casal em situação desconfortável.
Por Letícia Martins e Priscila Horvat, jornalistas com foco em saúde
“É só você parar de pensar em engravidar que acontece”. “É sua ansiedade que está atrapalhando”. “O problema é seu ou do seu marido?”. “Fulana não estava conseguindo engravidar, foi viajar e voltou grávida”. “Cuidado, Beltrana fez tratamento e engravidou de gêmeos”. “Você é nova, logo consegue” e “Ciclana fez tratamento e depois engravidou naturalmente, porque já não estava pensando nisso”.
Sugestões, perguntas e comentários como esses podem até parecer inofensivos, mas não ajudam quem está tentando realizar o sonho de ter um filho. “Eu queria muito engravidar e cada negativo me doía demais. Eu não queria parar de pensar, eu queria engravidar”, conta a pedagoga Adrielle Martins Luz Assis, de 26 anos, que, durante quase dois anos, lidou com as próprias expectativas e das demais pessoas enquanto tentava engravidar.
Para ela, ouvir de familiares e amigos frases como essas citadas no início do texto não deixou a jornada mais fácil. Pelo contrário. “Acho que essa foi a parte difícil. Eu esperava um apoio e eles tentavam me ajudar, mas do jeito deles, o que acaba piorando a situação, porque não sabiam o que dizer e os comentários aumentavam meu medo, ansiedade e insegurança”, afirma Adrielle, que sempre quis ser mãe e jamais imaginou que fosse enfrentar o diagnóstico de infertilidade. “Com seis meses de tentativas, passei com um especialista em reprodução humana, e só então recebemos o diagnóstico de infertilidade, seguido de duas opções: fazer uma cirurgia ou a fertilização in vitro”, relata a pedagoga.
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Como ajudar uma amiga ou casal que está tentando engravidar?
De acordo com a ginecologista obstetra Dra. Rivia Mara Lamaita, presidente da Comissão Nacional Especializada (CNE) de Reprodução Assistida da Febrasgo, em vez de reproduzir comentários negativos, a família ou amigos devem evitar julgamentos ou críticas e, se possível, trazer aspectos informativos e positivos. Ela explica que os casais com dificuldade de engravidar ou que receberam o diagnóstico de infertilidade passam por um desgaste físico e emocional muito grande e, portanto, “as pressões sociais só tendem a piorar a sensação de culpa e atrapalhar o processo”.
“Os casais que buscam as clínicas de tratamento encontram-se, em sua maioria, em estado emocional frágil e ansioso, e ser empático e acolhedor nesse momento é fundamental para aliviar o medo e as pressões”, afirma a médica, que também é professora adjunta do departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCM-MG).
Na opinião de Adrielle, a escuta atenciosa pode ser uma ótima forma de ajuda. “Se em vez de tentarem dar uma solução para o meu problema, as pessoas tivessem parado para me ouvir, veriam que estávamos extremamente fragilizados. Eu sentia que minha dor e meu sonho eram inviabilizados. Mesmo sabendo que todos só queriam ajudar porque nos amavam, eu queria ser ouvida e compreendida”, desabafa.
Segundo Adrielle, que passou pelo misto de emoções, a dica principal para quem quer ajudar uma tentante é praticar a escuta ativa e empática. Se você sentir realmente a necessidade de tocar no assunto, use a educação como base. Pergunte: “Você quer falar sobre isso ou prefere que a gente converse sobre outro assunto?”
Também pode ajudar colocar-se à disposição dizendo frases como “estou aqui, vou orar por vocês”, “você está sendo muito forte” ou, ainda, “se precisar de companhia para ir em algum médico ou exame, pode me chamar”. “Às vezes, um simples ‘vamos sair pra tomar um café e conversar?’ pode fazer muito mais efeito positivo do que um conselho popular”, afirma Adrielle, que não desistiu do sonho.
A pedagoga Adrielle Luz com a filha Aurora, depois de quase dois anos tentando engravidar. (Foto: arquivo pessoal)
Adrielle e o marido decidiram fazer a fertilização in vitro. Em 15 de abril de 2024, com 37 semanas e saudável, a primogênita do casal, nasceu. “Graças a Deus e à equipe médica que nos acompanhou ao longo da gravidez, conseguimos aguardar o termo para o nascimento dela. Aguardei internada e sendo monitorada na unidade semi-intensiva. Minha filha chegou cheia de saúde. Muito mais do que um dia fui capaz de imaginar. Ainda bem que nós não desistimos”, afirma a mãe de Aurora.