Quanto antes a mulher procurar ajuda médica, mais chances de realizar um aborto seguro.
Por Letícia Martins, jornalista com foco em saúde
A violência sexual é uma realidade devastadora que afeta a vida de milhões de pessoas no mundo. No Brasil, cerca de 822 mil casos de estupro ocorrem por ano, o equivalente a dois casos por minuto, segundo relatório do Instituto de Pesquisa Aplicada e Econômica (IPEA). Desse total, mais de 80% das vítimas são mulheres e seus agressores são principalmente parceiros, ex-parceiros, amigos e conhecidos.
Quando essa violência resulta em uma gestação indesejada, o trauma se intensifica, podendo comprometer a vida da mulher sob diversos aspectos. A lei brasileira permite a realização do aborto em três situações específicas: se a gravidez for decorrente de estupro, se ela representar risco de vida à mulher ou em caso de anencefalia fetal.
Porém, muitas mulheres desconhecem seus direitos e não sabem que a interrupção legal da gravidez é uma opção disponível. Essa falta de informação as impede de tomar decisões conscientes sobre sua saúde e bem-estar e muitas acabam colocando a própria vida em risco, realizando abortos em lugares clandestinos ou mesmo em casa com métodos inapropriados. “Após essas tentativas, muitas mulheres morrem e inúmeras ficam com sequelas. Por isso, é fundamental que as vítimas de violência sexual saibam que a interrupção legal da gravidez é uma opção disponível”, afirmou o médico ginecologista obstetra Dr. Rosires Andrade, presidente da Comissão Nacional Especializada (CNE) em Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Em caso de situações previstas em lei, o aborto pode ser feito independentemente da idade gestacional, mas o especialista ressalta: “O ideal é que o aborto seja realizado até a 12ª ou 14ª semana de gestação quando os riscos são bem pequenos. Após esse período, os riscos são maiores, principalmente de a mulher procurar fazer o aborto em locais onde não há profissionais capacitados para realizar o procedimento com segurança”, afirmou.
Onde realizar o aborto legal?
Como está previsto em lei, pode ser realizado em qualquer instituição, seja pública ou privada. “Quando a mulher procura o atendimento já grávida e pede para interromper a gravidez, alguns procedimentos devem ser realizados pela equipe de atendimento. Ela deve ser acolhida pelos profissionais de saúde que vão respeitar a sua decisão e não criticar, pois várias situações fazem com que muitas mulheres não procurem socorro imediatamente após a violência. Quando a mulher afirma que foi vítima de estupro e que dessa violência resultou a gravidez, o médico deve receber a informação com presunção de veracidade”, explica o Dr. Rosires.
Ele acrescenta que a decisão pelo abortamento fica restrita à mulher e ao médico, ou seja, não há necessidade de realizar boletim de ocorrência nem de comunicar qualquer informação à autoridade policial, exceto no caso de estupro de menores de 18 anos de idade. Mas é importante que a mulher registre o boletim de ocorrência para conhecimento das autoridades policiais e eventual identificação do(s) agressor(es).
Para finalizar, Dr. Rosires destaca: “O abortamento é um direito da vítima de estupro, mas não é uma obrigação, ou seja, a mulher tem a opção de interromper a gravidez ou levá-la adiante, permanecer com a criança e eventualmente entregá-la para adoção”.
Portanto, se você foi vítima de violência sexual e engravidou ou conhece alguém nessa situação, saiba que o aborto é um direito garantido por lei e que os ginecologistas e obstetras são treinados e capacitados para acolher as mulheres e orientá-las com segurança.