Por Letícia Martins, jornalista com foco em saúde
O climatério é uma fase marcada por mudanças hormonais e emocionais que podem impactar diretamente o desejo, a lubrificação e a resposta sexual feminina. Entenda como o estrogênio atua nesse processo, quais são os principais impactos na sexualidade e de que forma é possível redescobrir o prazer.
A função sexual feminina é resultado de uma combinação complexa de fatores: idade, experiências anteriores, saúde física e mental, uso de medicamentos e drogas, contexto sociocultural e, claro, as alterações hormonais que acontecem ao longo da vida.
Entre esses hormônios, o estrogênio tem papel fundamental. “O estradiol é um potente modulador neural, capaz de provocar mudanças estruturais e funcionais no cérebro”, explica a ginecologista Dra. Ana Lúcia Valadares, professora da pós-graduação em Tocoginecologia da Universidade de Campinas (Unicamp) e membro da Comissão Nacional Especializada (CNE) em Climatério da Febrasgo. Essas alterações favorecem a neuroplasticidade, influenciam o comportamento sexual e são essenciais para a receptividade e a motivação.
No corpo da mulher, o estrogênio também age de forma periférica, aumentando o fluxo sanguíneo genital, melhora a função sensitiva na região genital e contribui para a lubrificação adequada. Por isso, a redução natural do estrogênio durante o climatério pode trazer repercussões diretas na vida sexual.
Essa fase é marcada pela diminuição progressiva dos níveis de estrogênio e progesterona, ao mesmo tempo em que ocorre o aumento do FSH (hormônio folículo estimulante) e do LH (hormônio luteinizante), responsáveis por regular a atividade dos ovários. “Essas alterações hormonais podem levar a sintomas variados, que impactam de forma importante a função sexual feminina”, ressalta a especialista.
Os impactos na vida sexual da mulher
Sistema nervoso central
Ondas de calor, perturbações do sono, alterações cognitivas, ansiedade e alterações do humor estão entre os sintomas mais comuns que podem impactar na saúde sexual. “Uma mulher que não dorme bem por causa das ondas de calor acorda cansada, deprimida, e com nevoeiro cerebral. Tudo isso influencia tanto a relação com o parceiro quanto a função sexual”, diz a ginecologista.
Alterações metabólicas e ganho de peso
Durante a transição da menopausa e o envelhecimento da mulher é comum o ganho de cerca, com aumento da adiposidade visceral e da circunferência abdominal. Essas mudanças impactam a saúde física e podem afetar a autoestima e a sexualidade
Alterações cutâneas, mucosas e capilares
A redução no estrogênio provoca a redução da espessura, da hidratação e da elasticidade da pele, favorecendo o aparecimento de rugas, além de causar a queda de cabelo. Todos esses sintomas também afetam a autoimagem e, indiretamente, a sexualidade da mulher.
Sistema musculoesquelético
A dor nas articulações é outro sintoma frequente, que pode se tornar uma barreira para a atividade sexual.
Sistema urogenital
Uma das consequências mais marcantes é a síndrome geniturinária da menopausa, que inclui ressecamento vaginal, prurido, ardor, infecções urinárias de repetição e urgência urinária. Esses sintomas repercutem diretamente na vida sexual, pois podem provocar dor durante as relações sexuais.
“A dispareunia tem um impacto grande, porque muitas vezes leva à diminuição do prazer e do desejo. Uma mulher com dor acaba evitando o sexo, evitando o parceiro. Isso pode gerar estresse na relação e criar uma fuga da intimidade”, alerta a Dra. Ana Lúcia.
A prevalência da disfunção sexual
Estudos mostram que há um risco até cinco vezes maior de disfunção sexual na menopausa. Mais de 70% das mulheres apresentam dificuldades relacionadas ao desejo, à excitação e ao orgasmo. A dispareunia acomete mais de 70% das mulheres entre 52 e 55 anos e pode ser intensa em 40% dos casos. Além disso, 80% relatam sintomas vaginais durante ou após o ato sexual.
Outro dado relevante é a prevalência de inatividade sexual, presente em 20% das mulheres avaliadas em pesquisas. Entre os fatores associados estão insatisfação conjugal, autopercepção de saúde do parceiro e disfunção sexual feminina e masculina.
Além dos aspectos físicos, pesam ainda o estigma da sexualidade na maturidade, a desinformação e as barreiras socioculturais. Muitas mulheres normalizam sintomas como ressecamento vaginal e deixam de buscar atendimento médico. Em paralelo, parte dos profissionais ainda evita abordar o tema, criando um círculo de silêncio que mantém muitas delas sem tratamento.
Abordagens terapêuticas e novas formas de intimidade
O tratamento da síndrome geniturinária da menopausa pode envolver diferentes frentes:
- Terapias farmacológicas: incluem terapia hormonal sistêmica que ajuda aliviar as ondas de calor e melhorar o bem-estar, ou estrogênio terapia tópica vaginal. Além das opções não hormonais, como os lubrificantes e hidratantes vaginais.
- Apoio psicológico: terapias sexuais, práticas de atenção plena e técnicas de redução do estresse podem auxiliar. O suporte relacional, como terapia de casal ou grupos de apoio, é outro caminho importante.
- Intervenções físicas: a fisioterapia pélvica pode ser considerada para a síndrome geniturinária. A prática regular de atividade física também contribui para autoestima e disposição.
“Um ponto importante é explicar para a paciente que o prazer na menopausa é uma experiência única. Essa fase pode mudar a forma de intimidade, mas não significa que será pior”, afirma a Dra. Ana Lúcia.
Muitas mulheres relatam que, com o envelhecimento, houve uma aproximação maior do casal, com mais companheirismo e menos cobranças. “Outras, no entanto, têm dificuldade de aceitar as mudanças e ficam presas a um formato anterior de sexualidade. Por isso é tão importante ressignificar essa fase e incorporar as novas realidades corporais e emocionais”, completa.
Uma nova perspectiva
Aceitar as transformações da menopausa pode abrir espaço para redescobertas. O diálogo com o parceiro, o acompanhamento médico adequado e o autocuidado tornam possível uma sexualidade saudável e satisfatória.
Essa fase da vida não precisa ser marcada pela perda do prazer, mas sim pela construção de novas formas de intimidade, capazes de promover crescimento pessoal, bem-estar e conexão.
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