Violência contra a mulher: saiba como ajudar quem sofre agressão doméstica ou familiar

por Feito para Ela

Pesquisa aponta que mais de 50% da população já testemunhou meninas e mulheres sendo agredidas por parentes ou parceiros. Ligar 180 é uma das formas de ajudar.

Por Letícia Martins, jornalista especializada em saúde

Nenhuma pessoa deveria sofrer qualquer tipo de violência, mas infelizmente muitos episódios de agressão ainda acontecem diariamente, sobretudo contra as mulheres. Em 2022 uma mulher morreu a cada 24 horas no Brasil por ser mulher e ao menos um caso de violência contra mulher foi registrado a cada 4 horas, segundo o boletim “Elas Vivem: dados que não se calam”, divulgado pela Rede de Observatórios da Segurança em março deste ano.

Agressões físicas, ofensas ou assédios sexuais e abusos psicológicos são alguns dos tipos de violência contra a mulher que estão se tornando cada dia mais frequentes. A quarta edição da pesquisa “Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil”, encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segura Pública (FBSP) ao Instituto Datafolha, mostrou que o país está mais violento e inseguro para nós. Apesar de termos uma lei importante que visa prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher (Lei Maria da Penha Nº 11.340/2006), todas as formas de agressão (física, sexual, psicológica e patrimonial) contra o público feminino apresentaram crescimento em 2022 em relação aos três anos anteriores.

A pesquisa, que ouviu 2017 pessoas, entre homens e mulheres de126 municípios brasileiros no período de 9 a 13 de janeiro de 2023, traz um dado interessante de ser analisado: 52% dos entrevistados testemunharam alguma situação envolvendo meninas e mulheres sendo agredidas por parentes ou parceiro íntimo, bem como homens brigando ou abordando mulheres de forma desrespeitosa. Esse dado aponta para uma mudança de pensamento e comportamento necessária: a de que qualquer pessoa pode e deve ajudar uma mulher vítima de violência, mesmo que a agressão esteja sendo cometida em ambiente privado, como a residência do casal. A máxima “em briga de marido e mulher não se mete a colher” já caiu por terra há anos. Qualquer pessoa que presencie uma mulher sendo agredida e a própria vítima podem denunciar ligando para o 180, a Central de Atendimento à Mulher. As ligações podem ser feitas de todo o Brasil, gratuitamente, de qualquer telefone fixo ou móvel (celular), a qualquer hora do dia ou da noite.

A Central de Atendimento à Mulher registra as denúncias de violência contra a mulher e as encaminha aos órgãos competentes, além disso, fornece informações sobre os direitos da mulher, como os locais de atendimento mais próximos e apropriados para cada caso:

Quais são os tipos de violência contra a mulher?

Os fatores que impulsionaram o aumento dos casos de violência contra a mulher são muitos e variados, assim como as causas da violência. Entre elas destacam-se o machismo, a estrutura patriarcal da sociedade brasileira, o ciúme excessivo, a sensação de posse, a necessidade de controle e a concepção de que a mulher deve satisfazer o homem são alguns dos fatores que explicam, mas não justificam as agressões. De acordo com a Rede de Observatórios da Segurança, 75% dos feminicídios são cometidos por companheiros ou ex-companheiros das vítimas.

Além disso, há pessoas que acham que violência é somente agressão física, mas o art. 5º da Lei Maria da Penha define que violência doméstica e familiar contra a mulher é “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.

Existem 05 tipos de agressão:

  • Violência física: bater, empurrar, atirar objetos, morder, queimar ou puxar os cabelos da mulher, entre outros.
  • Violência psicológica: ameaçar, impor medo, humilhar, impor um tipo de roupa ou criar dúvidas sobre a sanidade mental da mulher etc.
  • Violência moral: como caluniar, difamar ou cometer injúria contra a mulher.
  • Violência patrimonial ou financeira: por exemplo, impedir a mulher de trabalhar, quebrar os pertences dela ou controlar o seu dinheiro.
  • Violência sexual: forçar a mulher a fazer sexo ou atos sexuais que causam desconforto; impedi-la de usar preservativo ou métodos contraceptivos; forçar matrimônio, gravidez ou prostituição por meio de coação, chantagem, suborno ou manipulação.

Para combater a violência contra a mulher são necessárias diversas ações articuladas em nível municipal, estadual e nacional, além iniciativas voltadas à conscientização da sociedade, como a instituição do Agosto Lilás, mês dedicado à intensificação da luta pelo fim da violência contra a mulher. “É muito importante falar sobre violência e discutir gênero na nossa sociedade. Vivemos uma epidemia, decorrente da questão complexa e estrutural. Temos que discutir essa problemática com a família e em todos os espaços de formação”, declarou o médico ginecologista Dr. Robinson Dias de Medeiros, presidente da Comissão Nacional Especializada (CNE) de Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei da FEBRASGO.

Embora pedir ajuda seja fundamental para quebrar ciclo de violência, pode ser bastante difícil e constrangedor para a vítima dar esse passo, principalmente em casos de violência sexual. Contudo, Dr. Robinson destaca: “É fundamental que ela receba apoio psicológico, prevenção contra as infecções sexualmente transmissíveis e HIV, e prevenção contra gravidez indesejada. Sem a orientação adequada e a realização do atendimento de emergência nas primeiras 72 horas após a agressão sexual, a situação de vulnerabilidade das vítimas amplia-se consideravelmente.”

A médica ginecologista e obstetra Dra. Maria Auxiliadora Budib, membro da Comissão Nacional Especializada (CNE) de Anticoncepção da FEBRASGO e professora adjunta da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), também ressalta a importância de se falar mais sobre o tema para que as vítimas de violência percebam que não estão sozinha e que é possível encontrar apoio profissional. “A violência sexual versa sobre o aspecto mais íntimo: a violação do corpo. A vergonha pode atrasar a ajuda e por isso toda comunicação social é importante. Falar sobre violência e suas diversas faces possibilita à sociedade identificar pessoas em vulnerabilidade”, disse a médica.

Tendo em vista que a violência contra a mulher vai muito além das agressões físicas, a médica aponta a importância de familiares e amigos ficarem atentos a alguns sinais que podem indicar que a mulher está sofrendo algum tipo de agressão. “O círculo do isolamento é comum em todas as interfaces da violência. A vítima se isola da família e dos amigos, muda o comportamento social e até o modo de vestir muitas vezes para esconder sinais de violência física. Ansiedade, depressão e baixa autoestima também são sintomas de violência”, expõe Dra. Maria Auxiliadora.

Ela explica que os ginecologistas, como médicos da mulher, recebem em seu dia a dia pacientes em situação de violência. “Estudos apontam que essas mulheres procuram ajuda de profissionais de saúde 35 vezes mais do que apresentam queixas em delegacia. Por isso, é essencial que os ginecologistas e obstetras estejam preparados para observar sinais diretos e indiretos de violência, acolher e apoiar essas mulheres, garantindo a devida notificação dos casos e encaminhamento para serviços adequados”, expõe Dra. Maria Auxiliadora.

Dr. Robinson afirma que a CNE de Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei tem “envidado esforços no sentido de ampliar a discussão do tema nos espaços de ensino e atuação, bem como nos eventos científicos da Febrasgo e de suas Federadas, reconhecendo a importância que tem a sensibilização do ginecologista e obstetra brasileiro para o enfrentamento dessa questão”. No último Congresso Brasileiro de Ginecologia e Obstetrícia (CBGO) da Febrasgo, as salas que abordaram o tema da violência contra a mulher estiveram cheias de congressistas e alunos interessados nas apresentações e discussões, o que demonstra o interesse dos médicos em atender bem essas pacientes.

Como ajudar uma mulher vítima de violência doméstica

Pessoas próximas à vítima que observam sinais como esses ou mesmo que presenciam algum tipo de agressão não podem ficar omissas. Há várias formas de ajudar uma vítima de agressão, como:

  • Saber que violência não é só física. Há cinco tipos de agressão e que a vítima não necessariamente terá marcas pelo corpo;
  • Acolher e jamais julgar a vítima, pois muitas vezes ela não reconhece o ciclo de violência que está sofrendo ou não tem condições de interrompê-lo;
  • Se você for uma pessoa próxima da vítima, pode incentivá-la a procurar ajuda especializada mesmo sem sair definitivamente de casa;
  • As denúncias não precisam necessariamente partir da vítima. Portanto, se você presenciar algum tipo de violência doméstica contra mulher, pode denunciar ligando 190, se a situação estiver acontecendo no momento ou 180 para registrar denúncias, receber orientações de serviços próximos ao local onde reside ou informações sobre leis e campanhas;
  • Conhecer e divulgar a Lei Maria da Penha (Nº 11.340/2006) e os direitos garantidos pela legislação que protege as mulheres contra a violência doméstica e familiar.
  • Compartilhar nas suas redes sociais e pessoais conteúdos confiáveis sobre a Lei Maria da Penha, os tipos de agressão e o disque 180, pois informações como essas podem salvar vidas.

Referências:

Boletim Elas Vivem: dados que não se calam, lançado pela Rede de Observatórios da Segurança. Março de 2023.

Pesquisa “Visível e Invisível: a vitimização de mulheres no Brasil – 4ª Edição”, encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Março de 2023.

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