Adolescentes têm respaldo para que suas informações não sejam repassadas sem permissão prévia.
Por Letícia Martins, jornalista com foco em saúde.
As primeiras visitas de uma menina ao consultório ginecológico podem gerar tensão entre a protagonista e sua família. As novas descobertas físicas, as mudanças hormonais, a menstruação e até a possibilidade de já ter iniciado a vida sexual deixam, muitas vezes, a adolescente com medo de ir ao médico e da reação da família ao ouvir o que ela tem a dizer ou perguntar.
A ginecologista Dra. Marta Rehme, vice-presidente da Comissão Nacional Especializada (CNE) em Ginecologia Infantopuberal da Febrasgo, explica que esse medo ocorre porque, na maioria das vezes, quem escolhe o profissional é a mãe, que nem sempre discute previamente com a filha sobre os motivos da consulta. “Às vezes, a mãe escolhe o profissional da sua confiança, que pode ser o seu próprio ginecologista, deixando a adolescente contrariada e receosa de conversar na primeira consulta”, analisa a médica e professora do curso de medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Para que a adolescente se sinta à vontade para perguntar e contar o que precisa, é muito importante que o profissional ofereça a ela a possibilidade de fazer a consulta desacompanhada, deixando claro que o sigilo pós-consulta será mantido. “Além disso, é importante que a menina saiba que o consultório ginecológico não é um tribunal e que ela não será julgada ao chegar lá, muito pelo contrário: será acolhida e orientada”, destaca a ginecologista Dra. Rosana Reis, presidente da CNE em Ginecologia Infantopuberal da Febrasgo.
Segundo a especialista, o médico está ali para escutar tudo o que a adolescente quer falar, mas ele também deve ficar atento a sinais que podem indicar se a menina está sofrendo algum tipo de abuso, fazendo uso de drogas ou se está em uma relação sexual consentida e gostaria de utilizar um contraceptivo, mas ainda não quis ou não conseguiu contar para os pais.
“Também orientamos a paciente sobre a necessidade da proteção, explicando os impactos que uma gravidez precoce pode trazer para a vida dela, pois entendemos que a sexarca (primeira relação sexual) está cada vez mais precoce, tanto para meninas quanto meninos. Se não orientarmos corretamente, teremos ainda mais gestações indesejadas”, afirma a Dra. Rosana.
Garantia de sigilo
Para que a adolescente se sinta confiante e à vontade para se consultar com o ginecologista, é fundamental que ela saiba também que existe uma ética do sigilo nas consultas médicas, garantida no Código de Ética Médica.
Abaixo, destacamos alguns direitos legais que protegem as informações médicas:
- Artigo 73: é vedado ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, exceto por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente;
- Artigo 74: é vedado ao médico revelar sigilo profissional relacionado a paciente criança ou adolescente, com capacidade de discernimento, inclusive a seus pais ou representantes legais, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente;
- Artigo 89: é vedado ao médico liberar cópias do prontuário sob sua guarda, salvo quando autorizado, por escrito, pelo paciente, para atender ordem judicial ou para sua própria defesa.
Quando a quebra de sigilo é permitida?
Há algumas situações que justificam a quebra do sigilo médico-paciente, por exemplo, quando a adolescente:
- apresenta déficit intelectual relevante;
- não tem percepção da realidade devido a distúrbios psiquiátricos ou ao uso de drogas;
- se recusa a fazer o tratamento por doenças de risco;
- está grávida;
- apresenta suspeita ou menciona ter sofrido algum tipo de abuso sexual;
- iniciou a vida sexual antes dos 14 anos;
- está exposta a atividades que coloquem em risco à sua vida ou a de terceiros.
“É importante que a paciente saiba que, no caso de necessidade de quebra de sigilo, ela será previamente informada da decisão do médico. Jamais acontecerá sem que ela seja a primeira a saber”, finaliza a Dra. Marta Rehme.
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