Conheça mitos e verdades sobre a nutrição e o impacto da alimentação na saúde da mãe e do bebê
Por Letícia Martins, jornalista com foco em saúde
Basta “dar um Google” para descobrir receitas incríveis para ajudar na fertilidade, chás milagrosos para regular o organismo da mulher e mais uma infinidade de ‘boas oportunidades’ para mulheres dispostas a pagar pelo valor de um ebook. Mas será que tudo isso tem algum fundamento?
Uma simples busca na internet pode revelar inúmeras dicas, mas é importante lembrar que muitas, talvez a maioria, não são embasadas na ciência. Para esclarecer essas curiosidades e alguns mitos, conversamos com a obstetra Dra. Adriana Gomes Luz, secretária da Comissão de Assistência Pré-Natal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e professora de obstetrícia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp). Acompanhe:
Feito Para Ela: Existem alimentos que melhoram a fertilidade?
Dra. Adriana Gomes Luz: Os alimentos ricos em antioxidantes, como frutas vermelhas e castanhas, e os ricos em ômega 3, como peixe e linhaça, podem ajudar na qualidade dos óvulos e do espermatozoide. Então, podemos dizer que eles ajudam a melhorar a fertilidade. Mas isso só é válido caso a mulher não tenha nenhuma condição de saúde, já que a fertilidade é considerada multifatorial, ou seja, envolve o casal, os hábitos, a alimentação, a idade, entre outros fatores. Portanto, não existe um alimento milagroso para a fertilidade, mas a alimentação saudável é um dos pontos que auxilia.
Feito Para Ela: Os chamados ‘alimentos afrodisíacos’ realmente funcionam?
Dra. Adriana Gomes Luz: Não existe comprovação científica para alimentos afrodisíacos. O que acontece é que, alguns alimentos, como chocolate e pimenta, ativam endorfinas no organismo, que dão a sensação de bem-estar e prazer. Exemplo disso é aquela vontade de comer chocolate que muitas mulheres sentem durante a TPM (tensão pré-menstrual). Nesse caso, a ideia faz sentido, mas não significa que o alimento seja afrodisíaco.
Feito Para Ela: A produção hormonal pode ser afetada caso a mulher seja vegana ou vegetariana?
Dra. Adriana Gomes Luz: Não necessariamente. Hoje os veganos e vegetarianos conseguem fazer dietas com aporte adequado de proteína, ferro e vitamina B12. Portanto, com uma alimentação saudável e equilibrada, além de conhecimento sobre os alimentos que podem suprir os nutrientes oferecidos na alimentação à base de carne, ovos, leite e seus derivados, é possível que a mulher vegetariana ou vegana tenha uma produção normal de hormônios.

Feito Para Ela: A alimentação da mãe pode afetar diretamente a saúde do filho?
Dra. Adriana Gomes Luz: Se durante a gestação a mulher tiver uma alimentação não regrada e desenvolver obesidade ou diabetes gestacional, isso pode predispor a criança a ter obesidade infantil e diabetes na vida adulta. Esse é um exemplo de que a alimentação e a saúde materna podem interferir no desenvolvimento da criança. Além disso, as deficiências nutricionais podem impactar diretamente no desenvolvimento imunológico e cognitivo (parte intelectual) da criança. Já existem vários estudos que mostram essa interferência.
Feito Para Ela: Gestantes podem consumir alimentos ou bebidas que contenham cafeína?
Dra. Adriana Gomes Luz: Na verdade, o que não pode é exagerar nas quantidades. No caso de gestantes, o limite máximo de consumo de café por dia é 200 miligramas (mg). Para se ter uma ideia, uma xícara de 240 mililitros (ml) de café coado pode corresponder de 75 a 200 mg de cafeína. Já o café expresso tem uma concentração maior de cafeína e, por essa razão, requer maior atenção no consumo. Normalmente, em uma xícara de 40 ml tem de 40 a 75 mg de cafeína.
O excesso de café pode aumentar o risco de trabalho de parto prematuro e baixo peso ao nascer. Também é importante lembrar que a cafeína não está presente só no café, mas também em alguns chás, refrigerantes, chocolates, entre outros. Às vezes, o produto tem uma quantidade pequena de cafeína, que pode passar despercebido se não olharmos a composição nutricional na embalagem.
Feito Para Ela: Os famosos ‘desejos de comer algo’ durante a gravidez podem indicar alguma deficiência nutricional?
Dra. Adriana Gomes Luz: As mudanças hormonais afetam o apetite das gestantes, levando a um aumento ou diminuição do desejo por certos alimentos. Por isso, é comum que mulheres grávidas, especialmente no início da gestação, desenvolvam aversão a alimentos que antes apreciavam. Essa aversão, porém, nem sempre está ligada a problemas digestivos, como exemplifica a especialista ao mencionar casos de intolerância ao leite e derivados que podem surgir durante esse período.
Além disso, é frequente que gestantes busquem alimentos específicos por se sentirem bem ao consumi-los, principalmente nos primeiros três meses da gestação, quando sintomas como náuseas podem intensificar a busca por alternativas mais palatáveis.
Entretanto, esse “fenômeno” dos desejos também pode ser exagerado. Algumas mulheres aproveitam a fase da gravidez para explorar essa aura mágica em torno dos anseios alimentares, buscando atenção especial do parceiro e/ou familiares, cientes de que seus desejos serão atendidos.
Vale ressaltar que, em alguns casos, essa dinâmica pode mascarar a necessidade emocional de afeto. Vale ressaltar que a ideia de que a falta de certos alimentos possa influenciar as características da criança — como a crença de que um bebê nascerá “com cara de bolacha” — é, em sua maioria, um mito. O desejo por alimentos, embora tenha uma dimensão física, pode refletir significados mais profundos e emocionais que merecem ser compreendidos.
Feito Para Ela: É verdade que processados e ultraprocessados afetam a saúde da gestante?
Dra. Adriana Gomes Luz: Sim, esses produtos alimentares possuem uma quantidade maior de aditivos artificiais, gordura trans, conservantes e sódio, que, no final das contas, podem aumentar o risco de hipertensão, retenção de líquido e complicações metabólicas. Por isso a orientação sempre é que as gestantes prefiram os alimentos naturais e conversem com um nutricionista para montar um plano alimentar com diversas opções de comidas saudáveis e práticas de preparar. Essa diferença pode ser vista também na digestão e no trânsito intestinal, facilitando a vida da gestante.
Conclusão
Alimentação e fertilidade estão conectadas, mas sem soluções mágicas. São diversas as conversas, conselhos, mitos e verdades sobre a alimentação e a gravidez. Mas o segredo que funciona por trás de todos eles é um só: manter uma alimentação equilibrada é essencial para a fertilidade e para a saúde da gestante e do bebê.
Embora não existam alimentos milagrosos, escolhas saudáveis podem fazer toda a diferença no bem-estar geral, inclusive antes da concepção. Consulte um especialista antes de mudar a dieta e faça um acompanhamento nutricional para garantir uma alimentação que atenda às necessidades do seu organismo.
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