Já que temos grandes chances de viver mais do que 80 anos, o ideal é planejar o envelhecimento desde agora.
Por Letícia Martins, jornalista especializada em saúde
A expectativa de vida da mulher brasileira ao nascer aumentou muito nas últimas décadas, mais até do que dos homens. Em 1980, as mulheres viviam em média 65,7 anos. Já em 2013, a expectativa era de 78,6 anos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). Chegamos em 2021 com uma expectativa de 80,5 anos para as mulheres e 73,6 anos para os homens. Vida longa aos brasileiros, hein?
Vários fatores são responsáveis por esse ganho de tempo na terra. A médica geriatra Daniela Souza Gonçalves Barbieri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia do Espírito Santo (SBGG ES), explica que o principal fator foi o avanço técnico-científico na medicina, permitindo prevenção em saúde, controle de doenças crônicas e tratamento efetivo de eventos agudos. “As mulheres sempre estiveram à frente no cuidado com a saúde, em sua maioria frequentando os consultórios de ginecologia periodicamente ao longo da vida, mantendo vacinas e saúde em dia nas gravidezes, presentes nos atendimentos do geriatra com mais regularidade”, declarou.
No entanto, melhor do que ter uma vida longa é envelhecer de forma saudável e isso não significa uma aparência jovem. Então, do ponto de vista da medicina, o que é envelhecer saudável?
“Envelhecimento ativo não é a ausência de doenças e nem ter a aparência da Jane Fonda [atriz americana nascida em 1937]. É ter saúde em todos seus aspectos: estar com as doenças bem controladas, ter boas relações afetivas e sociais, ter autonomia e independência, e gozar de boa saúde mental”, esclarece Dra. Daniela.
A geriatra acrescenta que o bom controle das doenças é fundamental para evitar sustos e internações, reduzir o risco de fragilização e de ficar dependentes de outras pessoas. “Isso inclui, além de tomar remédios e frequentar consultórios, colocar em prática mudanças de hábitos, por exemplo, adotar uma alimentação adequada, fazer exercícios regulares indicados para a sua idade e condição física e aderir a tratamentos não-farmacológicos.”
A partir de que idade começamos a envelhecer?
“Começamos a envelhecer a partir da maturação biológica. Quando paramos de crescer, começamos a envelhecer”, responde a médica geriatra. E a conta vai aumentando. Ao longo da vida, precisaremos de reserva de dinheiro, de músculo, de osso, de neurônios, de vínculos sociais, dos nossos órgãos sensoriais e de todo o resto até o final.
A pergunta principal é: como fazer estoque e poupar para não ficar sem no final da vida?
“Desde a vida intrauterina, acumulamos vitórias e perdas que constroem nossa história e podem influenciar na qualidade da nossa velhice. Acumular sequelas ao longo da vida ou não fazer uma reserva adequada de osso e músculo, por exemplo, podem ser determinantes para nos tornarmos velhos frágeis e dependentes”, disse a vice-presidente da SBGG-ES.
Quais cuidados são vitais para um envelhecimento saudável?
Já que temos potencial de viver até quase 100 anos (algumas pessoas superam esta marca!), o ideal é planejarmos bem essa viagem tão longa.
A Dra. Daniela lista alguns cuidados fundamentais, que podemos chamar aqui de estratégias:
- Exercícios físicos regulares são provavelmente o “carro-chefe”. Na juventude, eles potencializam o crescimento corporal e o pico de massa óssea e muscular. Ao longo da vida, aumentam a saúde cardiovascular, ajudam na prevenção e controle das doenças mentais, melhoram o sono e a autoestima, reduzem o risco de câncer, de obesidade e até de demência. Na velhice, diminuem o risco de quedas. Exercitar-se por no mínimo 150 minutos por semana com intensidade moderada aumenta a expectativa e a qualidade de vida.
- Outro ponto fundamental é fazer reserva cognitiva. Quanto mais anos de escolaridade temos, mais protegidos ficamos contra a demência, que é perda das capacidades cerebrais conhecidas como cognitivas, como a Doença de Alzheimer. Buscar aprender sempre, “quebrar a cabeça” com novas habilidades, dominar (ou pelo menos tentar dominar) tecnologias, fazer atividades que exijam concentração, como dança, jogos de estratégia, baralho e xadrez, é investir em neurônios e suas redes de comunicação, minimizando o risco de envelhecer com doenças da memória.
- Fazer exames regulares faz parte deste check-list do envelhecimento saudável.
– Ao longo da vida reprodutiva e no mínimo até os 60 anos, todas as mulheres precisam fazer o preventivo ginecológico (Papanicolau) anualmente para rastrear o câncer de colo do útero. Após dois exames seguidos com intervalo de um ano apresentando resultado normal, o preventivo pode ser feito a cada três anos.
– É importante fazer exames de sangue e consultas médicas regulares para diagnosticar precocemente doenças comuns no envelhecimento, como hipertensão e diabetes.
– A partir dos 45 anos, precisamos nos preocupar também com o câncer de mama, que o tipo de câncer que mais mata mulheres no mundo, e fazer mamografia anual.
– Colonoscopia periódica está indicado em geral a partir de 50 anos, pois o câncer de cólon é o terceiro mais comum no mundo e tem grande sucesso na prevenção e tratamento precoce com esse exame de rastreio.
– Em geral, após a menopausa, é preciso fazer também densitometria óssea para rastreio de osteoporose, doença silenciosa que facilita fraturas.
– Além desses, cada mulher poderá ser submetida a outros exames de acordo com seu perfil de risco individual.
E quais são os vilões do envelhecimento saudável?
A Dra. Daniela é categórica: “Definitivamente o cigarro, o álcool em excesso, o sedentarismo, os alimentos ultraprocessados, o excesso de gorduras, de açúcar e de sal, a poluição tanto do ar quanto sonora, o analfabetismo e a solidão.”
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